Índices Prognósticos em Unidade de Terapia Intensiva (UTI)
- Max Alves
- há 1 dia
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Introdução
A prática da medicina intensiva exige decisões clínicas rápidas e baseadas em evidências. Diante da alta complexidade dos pacientes críticos, os sistemas de pontuação prognóstica são ferramentas fundamentais para estratificação de risco, alocação de recursos, definição de condutas terapêuticas e avaliação da qualidade da assistência.
Esses escores são compostos por variáveis fisiológicas, laboratoriais e clínicas que, integradas, geram um valor numérico representativo da gravidade da condição do paciente. Os dois sistemas mais utilizados atualmente são:
APACHE (Acute Physiology and Chronic Health Evaluation)
SOFA (Sepsis-related Organ Failure Assessment)
Além de permitirem comparações interinstitucionais, esses escores são amplamente utilizados em estudos clínicos e auditorias de desempenho hospitalar.
1. Score APACHE
O APACHE é um dos sistemas de estratificação de risco mais utilizados em UTIs do mundo. Foi desenvolvido com o objetivo de prever a mortalidade hospitalar em pacientes adultos gravemente enfermos.
1.1. Evolução Histórica
APACHE I (1981): Primeiro modelo, com limitações estatísticas e clínicas.
APACHE II (1985): Tornou-se o mais difundido, com uso de 12 variáveis fisiológicas, idade e comorbidades.
APACHE III (1991): Maior acurácia, incluindo 17 variáveis fisiológicas.
APACHE IV (2006): Modelo mais moderno, com 129 variáveis, maior precisão na predição da mortalidade e tempo de permanência na UTI.
1.2. APACHE II – Estrutura
O APACHE II utiliza os piores valores das primeiras 24 horas de admissão na UTI. São analisadas 12 variáveis fisiológicas agudas, além da idade e da presença de comorbidades graves. A pontuação final varia de 0 a 71.
Variáveis incluídas:
Temperatura corporal
Pressão arterial média (PAM)
Frequência cardíaca
Frequência respiratória
Oxigenação (PaO₂ ou A-aDO₂)
pH arterial
Sódio e potássio séricos
Creatinina
Hematócrito
Leucócitos
Escala de Coma de Glasgow (ECG)
Cada variável recebe de 0 a 4 pontos, dependendo da gravidade da alteração. A soma dessas pontuações, acrescida de pontos por idade e comorbidades, compõe o escore total.
Limitação: Dependência de dados laboratoriais e variações interobservadores na coleta dos parâmetros clínicos.
2. Score SOFA
O escore SOFA foi criado para quantificar a disfunção orgânica em pacientes sépticos, mas atualmente é amplamente utilizado em todos os pacientes críticos, independentemente da etiologia.
2.1. Objetivos do SOFA
Monitorar a evolução da disfunção orgânica ao longo do tempo
Prever a mortalidade em pacientes graves
Auxiliar na definição de sepse e choque séptico (Sepsis-3)
2.2. Estrutura do SOFA
Avalia seis sistemas orgânicos com pontuação de 0 a 4 para cada sistema:
Sistema | 0 | 1 | 2 | 3 | 4 |
Respiração (PaO₂/FiO₂ mmHg) | ≥400 | <400 | <300 | <200 | <100 |
Coagulação (Plaquetas x 10³) | ≥150 | <150 | <100 | <50 | <20 |
Fígado (Bilirrubina mg/dL) | <1,2 | 1,2–1,9 | 2–5,9 | 6–11,9 | >12 |
Cardiovascular (PAM e vasopressores) | PAM ≥70 | PAM <70 | Dopamina ≤5 ou Dobutamina | Dopamina >5 ou Noradrenalina ≤0,1 | Dopamina >15 ou Noradrenalina >0,1 |
Sistema nervoso central (ECG) | 15 | 13–14 | 10–12 | 6–9 | <6 |
Renal (Creatinina mg/dL ou débito urinário mL/dia) | <1,2 | 1,2–1,9 | 2–3,4 | 3,5–4,9 ou <500 mL | >5,0 ou <200 mL |
Importante: Um aumento de ≥2 pontos no SOFA é indicativo de sepse e está associado a uma mortalidade ≥10%. SOFA diário: Na prática, o SOFA deve ser recalculado a cada 24-48h para avaliar a resposta ao tratamento. SOFA ≥11: Mortalidade estimada >90%.
3. Comparações entre APACHE e SOFA
Característica | APACHE II | SOFA |
Objetivo principal | Predição de mortalidade | Avaliação de disfunção orgânica |
Frequência de cálculo | Primeiras 24h | A cada 24–48h |
Componentes | 12 variáveis + idade + comorbidades | 6 sistemas orgânicos |
Usado para sepse? | Não especificamente | Sim – critério diagnóstico |
Complexidade | Alta | Moderada |
Predição de tempo de internação | Não | Não diretamente |
Popularidade | Alta (principalmente APACHE II) | Muito usado para sepse |
4. Aplicações Práticas
Avaliação de desempenho de UTIs: comparação entre instituições.
Pesquisa clínica: estratificação de risco em ensaios clínicos.
Decisões clínicas: suporte à escolha de intervenções agressivas, transferência ou cuidados paliativos.
5. Considerações Finais
Embora úteis, os índices prognósticos não devem ser utilizados isoladamente para decisões clínicas. Eles são complementares à avaliação médica e devem ser interpretados no contexto do quadro clínico do paciente.
Nenhum escore substitui o julgamento clínico. A atualização dos sistemas é necessária para manter a validade preditiva, pois as práticas e os perfis epidemiológicos mudam com o tempo.
Referências
KELLEY, Mark. Predictive scoring systems in the intensive care unit. UpToDate, 2017.
VEGE, Santhi Swaroop. Predicting the severity of acute pancreatitis. UpToDate, 2017.
HALL, Jesse B. Principles of Critical Care. 5. ed. McGraw Hill Education, 2015.
SOFA & APACHE II Calculators. Disponível em: https://www.uptodate.com
CEJAM. Sistemas de Escore Prognóstico em Terapia Intensiva. 2021. Acesso em: https://adm.cejam.org.br
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